sábado, 21 de dezembro de 2013

Desencanto – Francisco C. Trindade Leite (*)

Após quase quatro anos fui visitar minha cidade natal. É sempre uma emoção rever os lugares e as pessoas que foram e/ou ainda são importantes em nossas vidas, relembrar fatos e efemérides importantes em nosso passado, coisas do tipo. A gente volta às origens em busca de nossas referências, para novamente “beber” na fonte aquela mesma água que ajudou a construir nosso caráter e que nos ajuda a continuar definindo a direção que damos às nossas vidas – a compreender o para onde devemos ir.

É justamente sobre isso que quero comentar, infelizmente de forma triste. Resolvi expressar com a veemência devida, minha indignação para com o que vi (ou melhor, o que não vi) em nosso (finado) “Museu de Arte Pantaneira”. Deprimente. Mas permitam-me começar explicando, àqueles que não sabem, minha conexão pessoal com o “Museu de Arte Pantaneira”.

Fui Secretário Municipal de Educação em Aquidauana em 1998/1999. Em meu primeiro dia como Secretário, exatamente na primeira vez que fui entrar no gabinete, encontrei uma pessoa carregando uns “documentos velhos” que estavam na secretaria, em um carrinho de mão. Pedi para ver. Meu Deus! Lá estavam os originais da contabilidade da construção da Igreja Matriz, assinados pelo Teodoro Rondon, os documentos da construção da Ponte Velha, uma cópia do original da ata de fundação da cidade, e por aí afora. Naquele momento (o meu primeiro dia como secretário!), fiquei obsessivo por construir um museu na cidade, para preservar sua memória e proteger seus documentos históricos. Acabei descobrindo que a viúva do Manoel Antônio Paes de Barros (um dos nossos fundadores) havia doado a casa onde viveram, na rua Cândido Mariano, para a Prefeitura Municipal com o objetivo de fazer um museu para a cidade – se não me falha a memória, na gestão do prefeito Delfino Alves Corrêa. Aí estava o que eu procurava. Dediquei-me de corpo e alma para o empreendimento. Procurei restaurar a casa na forma como era originalmente. D. Sofia Rondon, que havia frequentado a casa e conhecido a proprietária, foi de inestimável valor ao indicar como eram os cômodos. Além dos documentos que encontrei na secretaria de educação, fiz uma campanha de doação e muitas pessoas doaram peças históricas para serem expostas permanentemente no museu. Inauguramos o “Museu de Arte Pantaneira”, inicialmente denominado Rubens Corrêa, no dia 15 de agosto de 1999. A inauguração foi matéria no jornal Gazeta Mercantil do dia 13/08/99. Quando vim de férias ao Brasil em 2002, no aeroporto de São Paulo, encontrei num livro sobre o Brasil, em inglês, uma foto grande da imponente fachada do nosso museu, recomendando aos turistas que o visitassem e apreciassem a coleção de documentos e artefatos históricos da guerra do Paraguai. Que orgulho! Guardo essa foto comigo até hoje. Mas vamos em frente.

Acho importante transcrever a definição do termo “museu”, adotada pelo Conselho Internacional de Museus, em 2001: “uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade e do seu desenvolvimento, aberta ao público e que adquire, conserva, investiga, difunde e expõe os testemunhos materiais do homem e de seu entorno, para educação e deleite da sociedade". Pois é. Acho que não era um museu, como eu pensei – se fosse, seria permanente, por definição. Mas ele acabou (ou será que devo dizer que criminosos o destruíram?), fazendo jus à triste máxima de que Aquidauana é a “terra do já teve”.

Saí de Aquidauana sem entender o que aconteceu com o nosso Museu. Como uma sociedade permite que quem quer que seja destrua um local que deveria ser referência, como diz sua própria definição, para educação e deleite da sociedade? Que sociedade é essa que, pretensamente conservadora, não valoriza suas próprias origens? Para onde vai uma sociedade que não respeita a referência de onde veio? Valorizar nossa história e cultura, reconhecendo seus acertos e erros, é a chave para avançarmos como civilização e os museus são a materialização de nossa memória. Basta visitar qualquer museu em qualquer país sério no mundo. Não gostamos do nosso passado? Ainda assim, vamos preservá-lo para que os mesmos erros/problemas não se repitam. Querem exemplos disso? Deem uma olhada nos museus do Holocausto ao redor do mundo.

Alguém destruiu nosso Museu. Desfigurou seu telhado. Devastou seu interior. Sabe-se lá onde foram parar os valiosos documentos e artefatos que lá se encontravam. Alguém tirou a chance de nossos descendentes de conhecer melhor de onde vieram para talvez compreender melhor para onde podem ir. E não vamos entrar no jogo simplista da culpabilidade: foi a administração do fulano ou do beltrano. A (ou as) administração (ou administrações) que permitiu (ou permitiram) que essa destruição acontecesse deve(m) sim ser responsabilizada(s), se possível criminalmente (porque isso é um crime contra o patrimônio e a memória pública). Mas a reflexão é mais profunda, e a verdade é que isso só aconteceu porque a sociedade como um todo não percebe a importância e nem valoriza iniciativas como essa, e consequentemente não possui mecanismos de supervisão e controle para evitar que crimes como esse aconteçam.

E agora, o que fazer? Eu gostaria imensamente de ver o ministério público responsabilizar aqueles que foram os responsáveis pela destruição. Eu gostaria imensamente de saber onde estão os documentos e artefatos históricos que estavam no Museu. Eu gostaria imensamente de ver a atual administração municipal agir séria e rapidamente e restaurar o Museu de Arte Pantaneira à sua condição original. Mas, acima de tudo, eu gostaria imensamente de ver o conjunto da sociedade aquidauanense valorizar sua história e suas origens, não permitindo que situações como essa jamais voltem a acontecer.

Sabe aquela água que vim beber de novo na fonte, como falei no começo deste ensaio? Pois é, ficou com gosto amargo, com gosto de tristeza. Não é a mesma água, com certeza. Não é essa a Aquidauana em que nasci e vivi. Não é essa a Aquidauana que eu sonhei.


(*) Francisco C. Trindade Leite, PhD em Educação, residindo atualmente nos EUA

Figura: Museu de Arte Pantaneira foi inaugurado dia 15 de agosto de 1999, aniversário de Aquiduana (Foto: Arquivo o Pantaneiro)


sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Breakfast do pardal e o fotógrafo atento


Esta foto eu fiz hoje na lanchonete do piso superior do Aeroporto Internacional Antonio João em Campo Grande/MS, enquanto aguardava a decolagem da aeronave que estava o amigo Julierme Gomes Barbosa. 

Uma mesa sem clientes tinha um pedaço de rosca e uma xícara de café. Não consegui fotografar o momento que um casal de pardal fazia o breakfast. Na tentativa de fotografá-los, eles voaram, porém, o pardal cavalheiro, voltava várias vezes para saborear a rosca e levar um pedacinho dessa para sua parceira que ficou fora da lanchonete, bem distante; na cobertura. 

Não sei por que me atento para cenas assim tão irrelevantes e fico observando detalhes. Acho que tenho que acabar com essa mania.

Ezio José da Rocha

Campo Grande, 11 de dezembro de 2012