quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

CONSELHO A SEGUIR SE QUER VELHICE TRANQUILA - POR HUMBERTO PINHO DA SILVA



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HUMBERTO PINHO DA SILVA - CONSELHO A SEGUIR SE QUER VELHICE TRANQUILA


Penetrou de rompante, mergulhando na amena penumbra que envolvia a saleta. Era loira; olhos redondos, azuis, de um azul celeste, resplandecente; tez clara, levemente anacarada, que lhe dava a encantadora beleza de boneca de porcelana da Baviera.


Sentou-se graciosamente numa cadeira de verga, junto à pesada mesa de mogno cubano, onde conversava com a prima Preciosa, à luz aconchegante de antigo candeeiro de cristal, pendente do teto.


Encaminhou-se o discurso da palestra para a terrível crise que desabou pelo nosso país, e na triste impossibilidade dos jovens constituírem família.


Consternadíssima, lamentava-se muito sentida, da falta de emprego e dos eternos salários baixos: - “Paga-se mal em Portugal!”; quando a moça, que pensativamente, escutava em absoluto silêncio, declarou num meneio dengoso, que a tornava ainda mais graciosa.


- “ Eu que o diga! Como pensar em casar, se o ordenado de ambos – o dela e do namorado – mal passa os três mil euros!?


E enquanto a mãe, de olhar triste, lastimava a má sina da filha, refleti:


Meu ordenado foi o suporte da família, porque não tinha outro; minha mulher, como dona de casa, que era, e é, não usufruía, nem usufrui salário


Com pouco menos de metade, paguei mensalidades em colégio e propinas em universidade privada.


Certo é que não frequentei, nem frequento, a sala de cinema, e menos ainda o teatro; mas não deixei, nem deixo, de assistir a famosos filmes e de ler o meu jornal; e ainda adquiri, ao longo de anos, consagradas obras de literatura: Vasta biblioteca de largas centenas de volumes, que há muito ultrapassaram o milheiro e meio.


Saltou-me então à memória, a notícia que recentemente li no matutino, que há, em bairro social – construído para abrigar necessitados, – quem obtenha rendimento de dois mil euros!


Recordei também – e com que saudade – de minha querida mãe, que sempre asseverava: para haver velhice feliz, preciso é aforrar de novo.


Arrecadar, periodicamente, em conta poupança, um pouco, é o único e seguro método de não passar tormentos na velhice.


Dir-me-ão, agora, por certo, os que recebem salários baixos: - “Havias de ter meu vencimento e meus encargos “; responderei com curtíssima história, que li, na juventude, narrada como verídica, ocorrida em vilória francesa.


Havia poderoso senhor, extremamente poupado, que vivia num grande castelo. Papelinhos e fósforos queimados, guardava-os para reutilizá-los, assim como outras excentricidades ridículas.


Criados e povo, pasmavam-se da sovinice de homem tão abastado, e acerbamente o censuravam.


Houve, um dia, dantesco incêndio, que deixou famílias na miséria. Grupo de meninas, seriamente condoídas, resolveram levantar donativos, pelo povoado.


Lembraram-se do avarento, mas logo reprovaram a ideia. Mesmo assim aventuraram-se ir ao castelo.


Encaminharam-nas a ampla sala de sólidas paredes de pedra, parcamente mobilada. Ouviu-as atentamente, o castelão, e após prolongada pausa, ergueu-se, abriu gavetinha de contador, e retirou avultada quantia.


Perante expressão de espanto, esclareceu:


- Estão admiradas!; fiquem sabendo que é devido aos papelinhos e fósforos queimados e outras “ sovinices” , que posso oferecer-vos essa importância.


São as pequenas economias, que permitem as grandes extravagâncias; mas as cigarrinhas não compreendem, e o Estado – cuja obrigação é fazer justiça, – muitas vezes lapida quem aforra.


Mas que havemos de fazer, se a inveja e a cobiça, não têm limites?


HUMBERTO PINHO DA SILVA - Porto, Portugal


publicado por solpaz às 18:44
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